Todos nós, de tempos em tempos, lidamos com emoções que nos fazem sentir mal. A vida manifesta-se em nós através das emoções. Somos seres sensíveis e estamos programados para sentir o mundo através de sensações, nem sempre agradáveis. Mas como lidar saudavelmente com as emoções que nos retiram energia, que nos botam para baixo, que nos prejudicam o sono e fazem disparar a ansiedade e a desesperança? Acredito que a resposta esteja na procura de autoconhecimento através da autoconsciencialização.
O poema que se segue é representativo da atribulação emocional que muitos de nós somos alvo ao longo da vida.
EMOÇÕES INCÓMODAS
Emoções negativas, sensações dolorosas, sentimentos pejorativos, sintomas incómodos,
Sou o seu alvo predileto,
Sou responsável e altamente funcional no meu trabalho,
Mas lá vêm as emoções, angústia, decepção, frustração,
Perturbações no sono, cansaço crónico,
Tornam-me reativo, agressivo, tornam-me excessivamente preocupado,
humor depressivo, baixa autoestima,
Perco a minha autonomia, revolto-me, sinto-me esmagado por tudo o que sinto,
O que se passa comigo, o que as minhas emoções me estão fazendo?
Sinto que me corroem por dentro,
Sou eficaz e eficiente nas tarefas que realizo, conheço-as, controlo-as, sou bem sucedido,
Mas quando as emoções avassaladoras me invadem, perco o controle, como se fosse possuído por algo que desconheço,
Estou confuso, aumento a minha tensão, sinto-me atormentado, perdido,
Descarrego nos outros, torno-me insensível aos outros,
Por momentos sinto-me autista, as minhas dores vão-me alienando do mundo,
Sofro por antecipação, estou sempre à espreita do que lá vem, do que pode vir, sinto-me frustrado pelo que não vem,
O que se passa comigo?
A minha cabeça não tem descanso, rumina, escrutina, remexe no passado, alarma-se com o futuro,
As minhas emoções estão gritando, não as consigo proteger e elas ferem-me a alma,
Vivo a reboque dos meus sentimentos incómodos,
Sou alvo incessante dos meus pensamentos negativos,
Sou vitima constante da experiência do meu corpo,
Um corpo em que vivo à anos, que desconheço, desconheço-me,
O que se passa em mim, o que se passa comigo, o que vive comigo?
O que está tomando a minha vida de assalto,
Aprendi a ler, escrever, os sinais de trânsito, conduzo, percebo de tantas coisas,
E de mim?
O meu desconhecimento acerca de mim mesmo tomou-me invadiu-me, sequestrou-me e leva-me a fazer coisas que me prejudicam,
Eu assisto, grito de dor, vou sofrendo, revolto-me comigo, com os outros e com o mundo, tudo parece estar mal,
Pareço não me conhecer, não me controlar, não me orientar,
Falo para mim, mas não me oiço,
Obrigo-me a fazer coisas, mas não as realizo,
Prometo, comprometo-me a mudar, fracasso,
Fico desiludido, iludido, e sofro,
Um sofrimento imenso por desconhecimento de mim mesmo,
Uma vida a aprender, não aprendi a lidar comigo mesmo,
Indigno-me, informação e mais informação para ser bem sucedido profissionalmente e sou um caos emocional,
O que falhou?
Conhecer a condição humana, saber aceitar os meus impulsos, ser assertivo, resiliente, lidar com a frustração, acalmar-me, regular os meus estados internos, solucionar os meus conflitos, saber falar comigo e para mim, compreender e orientar os meus pensamentos, aceitar as perdas, os incómodos, os outros, as opiniões dos outros, saber respeitar, dar-se ao respeito, saber os meus limites, as minhas faltas, para que servem as emoções, como se manifestam no corpo, como elas influenciam o que penso, a forma como atuo.
Tanta coisa que aprendi e esqueci, outras tantas que não me ensinaram e tanta falta me fazem,
Aprender o que sou, quem é este Homo sapiens, o que o define, o que o move, como se manifesta, como se protege, porque se torna agressivo,
Tantas coisas para aprender, tantas coisas que poderia ter aprendido acerca deste maravilhoso ser,
Ser humano, o que é?
Conhecer-se a si mesmo é ser humano.- Miguel Lucas
PASSO 1 – RECONHECER
O primeiro passo é reconhecer a sua emoção, isto pode parecer ambíguo, mas basicamente o que eu estou querendo dizer é que você deve esforçar-se para tomar consciência de que ouve uma alteração do seu estado de ser, e que isso desencadeou uma reação emocional na forma de comportamento físico ou verbal. Por exemplo, se você vai a dirigir o seu carro e alguém faz uma manobra perigosa em que você foi forçado a frenar, provavelmente começará a gritar e a dizer alguns palavrões. Ficar ciente desse comportamento, é uma forma de identificar a sua raiva ou irritabilidade.
PASSO 2 – DESCREVA A SUA EMOÇÃO
O segundo passo é descrever a sua emoção. Não basta reconhecê-la através dos seus comportamentos e atitudes, importa também descrevê-la. Para que isso possa ser realizado de forma saudável, tente não utilizar adjetivos, mas sim descrever de forma específica o que está a sentir no seu corpo ou como se sentiu relativamente à pessoa envolvida. Pegando no exemplo anterior, você poderia dizer algo do género: “Fiquei com o coração a sair pela boca, sinto como se o meu corpo ficasse carregado de energia e apetece-me gritar.” A seguir provavelmente você já conseguiria observar os seus pensamentos, e de que forma o comportamento alheio ia contra os seus valores. Poderia prosseguir com o discurso: Algumas pessoas não respeitam a prioridade dos outros, nem se interessam pela sua segurança, só olham para os seus interesses.” Ou você poderia preferir relativizar e dizer: “Provavelmente teve um dia terrível, estava a pensar em outro assunto e tomou uma má decisão. Não vale a pena reagir agressivamente, porque também eu por vezes falho.”
PASSO 3 – NÃO RESISTA ÀS SUAS EMOÇÕES INCÓMODAS
O terceiro passo é não resistir às suas emoções. Inevitavelmente aquilo em que focamos a nossa atenção expande-se. E, isso é igualmente viável para todos os nossos sentimentos e sofrimento emocional. Claro que tudo aquilo que você mais quer é ver-se livre do seu mal-estar, eventualmente dizendo: “Eu não me quero sentir assim.” O que acontece é que apenas por ação da vontade nós não conseguimos mudar de estado. Conseguimos mudar sim, mas temos de implementar estratégias de mudança de foco da atenção e de orientação de pensamentos e ações. Então, quando você não aceita os seus sentimentos negativos e sensações corporais incómodas, aciona o processo de foco sobre o seu estado de mal-estar, aumentando ainda mais a sua dor emocional.
Você tem de entender que as emoções negativas e pensamentos negativos expressam-se em nós, fazem parte de nós. Não resistir-lhes é uma benção que permite aceitá-los. Ao aceitar você fica numa posição para lidar de forma mais eficaz com todo o seu incómodo, dando-lhe disponibilidade mental para dirigir o foco para estratégias que contribuam para melhorar o seu estado atual.PASSO 4 – OBSERVE A SUA EXPERIÊNCIA
O objetivo de aceitarmos e desapegarmo-nos dos nossos pensamentos e sentimentos é tornarmo-nos mais conscientes das nossas próprias experiências. Simplificando, é estar consciente da nossa experiência presente sem julgamento (atenção plena). Não quer dizer que não possamos posteriormente avaliar se os pensamentos e sentimentos nos servem ou não. Devemos fazê-lo numa fase posterior, mas levando dois pontos em consideração:
- Não podemos deixar de sentir determinados sentimentos que se manifestam no nosso corpo, nem podemos evitar que determinados pensamentos nos surjam na mente.
- Nós não somos os nossos sentimentos nem pensamentos, pelo que devem ser filtrados pela nossa consciência para que não julguemos que somos tudo o que sentimos ou pensamos.
Assim, quando a nossa mente produz pensamentos que são angustiante para nós, numa primeira fase deveremos apenas observá-los. Não devemos acrescentar mais nada a esses pensamentos ou julgá-los de qualquer forma. Devemos fazer como se fossem automóveis a passar à nossa porta de casa.
Seguindo o exemplo anterior: Se na minha mente disparasse o pensamento: “O que está errado comigo? Tudo está bem na minha vida e eu ainda me sinto deprimido. Eu sou um perdedor.” Eu poderia continuar a elaborar algumas das seguintes respostas:
- “Eu não deveria ter esse pensamento. Não é bom para mim.”
- “Eu realmente sou um perdedor”.
- “Eu odeio quando eu acho estas coisas acerca de mim!”
Mas esses pensamentos são disparados porque eu estaria a resistir à ideia inicial. Os meus esforços para me livrar do pensamento doloroso e emoções negativas associadas só iriam resultar em mais dor. Então, em vez de todo este processo de raciocínio destrutivo, se eu tivesse apenas observado o meu pensamento e emoção, sem juízos, eu diria a mim mesmo: “Ah, estou a ter um pensamento que me alerta que algo pode estar errado comigo. Eu não sou este pensamento. Eu não vou seguir este pensamento. Vou focar-me nas coisas que tenho que fazer hoje.”
E é isto. Numa primeira fase observe a sua experiência interna (pensamentos e sentimentos) sem julgamento e sem críticas. Não lute com aquilo que sente no seu corpo ou que lhe aparece na mente, não tente evitar essa experiência. Permita-se apenas a observá-los como se fossem um automóvel a passar à porta de sua casa. E se é um pensamento que passa na sua cabeça, você pode deixá-lo ir, tal como deixa ir o automóvel que passa à sua porta.
PASSO 5 – AUTOINSTRUÇÕES DE ORIENTAÇÃO DAS AÇÕES
O passo 5 é usar as autoinstruções para guiar as suas ações. As autoinstruções estão ligadas à indução de estados internos que desejamos sentir ou que pretendemos acionar. No treino da autoinstrução, os pensamentos são traduzidos em verbalizações silenciosas, induzem as sugestões de sensações e imagens corporais. Como o nome indica, a metodologia de autoinstrução implica que a pessoa fale consigo própria para se convencer a agir e, depois para guiar a sua ação, usualmente dirigida a um objetivo, como confrontar um sintoma, como por exemplo quando sofre de ansiedade, resolver um problema perturbador, ou alterar um estado de humor.
A autoinstrução motiva a ação e informa sobre o que fazer, especialmente em situações tensas e confusas. Nesta perspetiva os métodos de autoinstrução são igualmente de autosugestão. A autoinstrução é considerada uma aptidão de confronto. Permite mobilizar-nos ativamente contra os sintomas incapacitantes e problemas de descontrole emocional. Ou seja, a autoinstrução é dirigida para fins diretos e quase sempre concretos, que requerem controlo cognitivo, emocional e/ou comportamental.
Em situações de ações impulsivas, agressivas ou fora do nosso controle deliberado, para reverter e/ou inibir este processo, dever-se-á controlar os comportamentos inadequados, que consiste essencialmente num processo de modelagem de ações apropriadas, autoinstruídas explicitamente pela própria pessoa. Por exemplo, no treino para pensar antes de agir, enquanto executa a tarefa ou se expõe à situação problemática, deverá verbalizar em voz silenciosa para si próprio as autoinstruções de aprendizagem e controle seguindo uma ordem preestabelecida:
Técnicas a praticar:
- Definição do problema ou preparação para a situação (“que tenho de fazer?”; “qual deve ser a minha atitude?”)
- Orientação e reforço da atenção (“tenho de me lembrar…”; “tenho de pensar com cuidado e estar atento…”; “não me posso distrair…”; “devo prosseguir devagar e tentar estar relaxado…”; “se visualizar o que pretendo, será mais fácil de conseguir…”)
- Autoreforço ou incentivo (“bom, até aqui tudo bem…”; Sou mesmo capaz de me controlar…”; “Sou capaz de dirigir a atenção para os pensamentos que imagino serem-me úteis…”)
- Autoavaliação e autocorreção (“estarei a fazer bem?”; “se errar posso sempre tentar de novo…”; vou falando aquilo que acho e vejo como me sinto…”)
Abraço,
Miguel Lucas
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